Do real à metáfora
"Existem trabalhos muito interessantes que argumentam sobre o impacto do desenvolvimento político não só sobre os métodos de fazer ciência, mas igualmente nas crenças científicas. [...] Não há qualquer dúvida, por exemplo, de existir simbolismo político associado à cosmologia, e que a interpretação correcta desse simbolismo ser frequentemente argumentado pelo discurso político. O arranjo ptolemático dos objectos celestes colocava o Sol, o símbolo comum da realeza, junto aos outros planetas, sugerindo que o Rei e a nobreza (representada pelos planetas) partilhavam a autoridade política, com muito do poder real a ser mediado pelos nobres. O sistema de Copérnico, porém, dispunha-se mais facilmente a suportar monarquias absolutistas. Há medida que os monarcas caminhavam em direcção ao poder absoluto, a cosmologia copernicana mostrava-se progressivamente mais útil. É preciso não supor que aos absolutistas apenas interessava apresentar o novo sistema, de forma casual, como uma imagem da nova ordem: era virtualmente essencial para eles demonstrar um apoio natural que suportasse as suas afirmações políticas. Apenas desta forma poderiam eles satisfazer a expectativa geral de, como criação de Deus, a ordem do cosmos reflectia, de forma relativamente óbvia, a ordem da sociedade. Para nós, este tipo de conversa parece não mais que uma metáfora, mas no período inicial da modernidade era uma expectativa real baseada na crença das correspondências (a ideia que partes diferentes da criação divina correspondiam a outras partes, revelando, assim, o plano de Deus). Os novos arranjos políticos tinham de ser justificados em termos dos arranjos naturais, de outra forma pareceriam artificiais e disfuncionais. Isto não significa que Copérnico e os seus seguidores desenvolveram deliberadamente a nova astronomia para promover as suas crenças políticas. A progressiva aceitação do heliocentrismo, porém, pode talvez ser vista como uma indicação da mudança fundamental do que era visto como a ordem natural das coisas." pg.103-5, John Henry, The Scientific Revolution and the Origins of Modern Science
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