outubro 24, 2007

Colapso

Há aqueles que, num dado momento, seja pela fortuna ou pelo mérito que os elevou socialmente, perdem um pouco do que, a todos, nos faz pessoas. São os que se vestem, comem, trabalham e falam sem nunca sair dessa máscara social que tanto consideram. Desde juízes, médicos, advogados, catedráticos, deputados, engenheiros, (ex-)ministros, bispos e muitos outros (a sociedade também se estima pelos diferentes tipos de sucesso que sustenta) deixaram de ouvir a metade da humanidade que avaliam como abaixo deles. A vida, a rede social que nos liga, passou a ser a imagem destorcida dessa hierarquia que habitam. Ouvem os que estão acima e falam para os que estão abaixo. O que era (e é) uma via aberta de dois sentidos transforma-se numa complicada burocracia de direcções únicas. Ao destruir esta maioria de laços com a sociedade, perdem o contacto do real fora deles e distanciam-se, lentamente, para um mundo mais pequeno, uma ilha onde exercem a actividade que tanto prezam, satisfazem a ambição que os motiva, concretizam o objectivo que os sufoca. Um arquipélago envernizado na pretensão de excelência, cercado (como todas as ilhas) de um Oceano de banalidade que ignoram, desprezam ou, não raras vezes, temem.

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