Um Equilibrio Flutuante (última parte)
E volta a ansiedade: «Quando é que acaba este processo? Não estaremos na direcção de uma sociedade 100% medicada em que ninguém é responsável e todos são vítimas de um evento passado (genético ou ambiental)?». Não, não estamos. Porque existem forças – não metafísicas mas sociais e políticas – que se opõem a essa tendência. E são do mesmo tipo que impede que, por exemplo, a idade mínima de condução não seja trinta anos: as pessoas querem ser responsabilizadas! Os benefícios esperados que derivam de ser um cidadão por inteiro numa sociedade livre são tais que existe uma forte atracção para se ser incluído. A possibilidade da culpa, da punição e da humilhação pública são preços que aceitamos de bom grado somente para podermos voltar ao jogo depois de termos sido apanhados numa transgressão. E se formos um cidadão respeitado a melhor estratégia para manter a desculpabilização afastada é proteger e realçar o valor do próprio jogo. É a erosão dos benefícios do jogo (não o avanço científico) que podem ameaçar o equilíbrio social (como o slogan soviético a adivinhar o colapso: «eles fingem que nos pagam, nós fingimos trabalhar»).
[adaptado do Freedom Evolves de Daniel Dennet, Penguin Books, 2003]
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