Sãos e normais
Seja a sanidade o funcionamento psicossomático correcto (saudável, consistente) do corpo e, em especial, do cérebro e da mente. Seja a normalidade a adaptação à respectiva cultura, i.e., uma integração social adequada. Uma cultura -- o resultado de uma complexa negociação sobre uma visão simplificada do real -- impõe limites, normas e proibições ao possível do corpo. A aceitação ou não desses limites define a fronteira entre o normal e a neurose. O grau de liberdade numa cultura estabelece apenas onde se desenha essa fronteira, o quão diferente podemos ser uns em relação aos outros, mas não é capaz de eliminá-la porque há sempre compromissos a fazer quando se vive em comunidade (talvez aí a atracção do paraíso). Como só numa cultura faz sentido falar de pessoas, o animal humano nela criado vê-se, assim, sobre uma pressão inevitável que impede a sua sanidade completa, irrestrita, mas que é essencial à coesão da própria cultura. O 'objectivo' de uma cultura é formar pessoas normais (e manter, gerir, a sua medida de normalidade), não é criar animais sãos. Esta última, para ser estável e douradora, é a tarefa do formigueiro.
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