O consumismo explica o paradox de Fermi
"A história é a seguinte: Algures nos anos 40, Enrico Fermi falava com outros Físicos sobre a possibilidade de inteligências extra-terrestres. Eles estavam impressionados pela nossa Galáxia conter mais de 100 mil milhões de estrelas, que a vida evoluiu rapidamente na Terra, e que uma espécie inteligente, capaz de se reproduzir exponencialmente seria capaz de colonizar a Galáxia em poucos milhões de anos. O raciocínio seguia que, actualmente, essas inteligências já seriam comuns. Fermi ouvia pacientemente e fez-lhes uma pergunta simples: “Então, onde estão eles?” Se a inteligência ET é comum, porque não chegaram ainda ao nosso planeta? Este dilema é hoje conhecido pelo paradoxo de Fermi.
[...] Parecem existir duas possibilidades. Ou a Ciência sobrestimou a possibilidade de inteligência ET ou talvez essas inteligências tenham uma tendência para se auto-limitarem, até mesmo auto-exterminarem. [...] Eu sugiro uma terceira possibilidade, talvez uma ainda mais sombria solução para o paradoxo de Fermi. Basicamente, os ETs não se explodem a si mesmos, eles apenas se viciam em jogos de computador. Eles esquecem-se de enviar sinais rádio ou colonizar o espaço porque estão muito ocupados a consumir e em exercitar o seu narcisismo numa qualquer realidade virtual. Eles não precisam de Sentinelas para os escravizar numa Matriz, eles fazem-no a si próprios, como nós fazemos hoje em dia.
O problema fundamental é que uma mente desenvolvida precisa tomar atenção a pistas indirectas de adaptação biológica, em vez de se focar na própria adaptação. Nós não procuramos o sucesso reprodutivo directamente; nós procuramos comida saborosa que promova a sobrevivência e parceiros interessantes que nos possam dar a melhor descendência possível. Resultado moderno: fast food e pornografia. A tecnologia é bastante boa para controlar a realidade externa e aumentar a nossa adaptação biológica real, mas é ainda melhor a criar e promover adaptações falsas – pistas subjectivas de sobrevivência e reprodução, sem os efeitos reais. Um sumo natural de laranja custa muito mais que um refrigerante de fruta light. Ter amigos requer um muito maior esforço que seguir o Friends na TV. Na verdade, colonizar a Galáxia é muito mais difícil que fingir fazê-lo na Guerra das Estrelas.
A tecnologia que cria adaptações falsas tende a evoluir muito mais depressa que a nossa resistência psicológica ao processo. Desde que a imprensa foi inventada, as pessoas lêem mais e têm menos filhos. Desde que a Xbox foi inventada, as pessoas preferem ser uma versão de alta-definição do King Kong do que ser um ser humano real de definição perfeita. Os adolescentes vêem-se cercados por uma multidão de produtos electrónicos que lhes cativam a atenção, e fazem menos exercício físico. Um licenciado no MIT prefere entrar na indústria dos jogos do que ir para a NASA.
Por volta de 1900 as invenções eram sobre a realidade física: carros, aviões, luz eléctrica, soutiens, zippers. Em 2005, a maioria das invenções são sobre entretenimento virtual. As principais patentes são da IBM, Canon, HP, Intel, Toshiba, não da Boeing, Toyota ou Wonderbra. Nós já mudámos de uma economia real para uma economia virtual., da física para a psicologia como critério para a alocação de valores e de recursos. O princípio do prazer de Freud triunfa sobre o princípio da realidade. Nós concentramo-nos em emitir localmente estórias de interesse humano, uns para os outros, e não em emitir mensagens de paz e progresso universal para outros sistemas solares.
Talvez os ETs tenham feito o mesmo. Eu suspeito que um período de narcisismo e de adaptações falsas seja inevitável quando uma espécie inteligente evolui. Esta é a Grande Tentação para qualquer espécie tecnológica – de moldar a sua realidade subjectiva para providenciar sobrevivência e sucesso reprodutivo sem substância real. Talvez a maioria destas espécies se extingam gradualmente, alocando cada vez mais tempo e recursos para os seus prazeres, e cada vez menos para as suas crianças.
Talvez certas personalidades, passadas geneticamente e culturalmente, resistam à Grande Tentação e durem mais. Aqueles que persistirem terão mais auto-controle, serão mais pragmáticos. Terão um horror ao virtual, às drogas que alteram a mente, à contracepção. Irão salientar o valor do trabalho árduo, a gratificação adiada, a educação dos filhos, a protecção ambiental.
A minha ideia perigosa é que isto já está a acontecer. Os fundamentalistas, os activistas anti-consumo, já entenderam o que é a Grande Tentação, e têm uma resposta para evitá-la. Eles isolam-se da nossa economia e produtos virtuais e esperam pacientemente que o nosso narcisismo nos destrua. Serão eles a herdar a Terra, como ETs semelhantes a eles herdaram os respectivos planetas. Quando, finalmente, se estabelecer Contacto, não será uma reunião de leitores de ficção científica ou de apreciadores de jogos de computador. Será um encontro de pais de família extremamente sérios que irão congratular-se mutuamente por terem sobrevivido não só à Bomba mas também à XBox. E trocarão brindes não num ambiente virtual semi-erótico mas sim no solo sagrado de uma Igreja." adaptado do texto de Geoffrey Miller
4 comentários:
Olá!
Já aqui não vinha há algum tempo e gostei bastante deste texto.
Uma coisa que me preocupa é a progressão da ficção mítica, tipo Harry Potter ou a «gótica». Isto como sinal de outras progressões mais perigosas, como o Criacionismo. Para mim é o regresso ao mito e o abandono de alguns dos maiores progressos que a inteligência humana já tinha feito.
Abraço
Caro Perplexo,
Há muito tempo, realmente. Espero que esteja tudo bem contigo.
Cada vez há mais gente a falar do início de uma era de endarkment (em oposição ao enlightment) com o avanço reforçado das astrologias, superstições, fanatismos, magias, etc. É possível que sim, apesar destes tempos mediáticos onde tudo é multiplicado, podermos estar apenas a ouvir falar daqueles que antes passavam despercebidos. É difícil perceber a dimensão do perigo, principalmente da aberração do criacionismo.
Abraço,
O texto é sem dúvida interessante embora a conclusão me pareça algo precipitada e contraditória. Digamos que é no mínimo discutível que os fundamentalistas sejam arquétipos de "pais de família extremamente sérios" e que tenham uma "resposta" para a evitarem que não implique, de alguma forma, uma regressão (daí a contradição - se seguirmos os fundamentalistas nunca nos iremos reunir com ETs...). Quanto aos outros ditos "activistas anti-consumo" também me parece discutível que não sejam também eles uma forma de narcisismo...
Sim, o texto tem alguns pontos em que se contradiz, mas creio que compensa essas potenciais falhas pela provocação que encerra.
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