setembro 19, 2005

Troca

É comum considerar as religiões do Livro (e o reflexo nele de um deus único) como o culminar evolutivo da religiosidade. Mas o que acontece quando ao saber escrito nesse livro - e fervorosamente conservado pelo que se chama de ortodoxia - não é permitida mais que uma interpretação? Enquanto se pode congelar um argumento, não é possível fazê-lo com o mundo. Este evolui, a natureza necessita de novas explicações, pensamos de forma diversa em cada século que passa. Se o Livro se torna pedra gravada, a diferença entre o literal que se lê e o literal que se vive torna-se progressivamente maior. Enquanto uma religião sustentada num padrão de ritos e textos contraditórios mais facilmente se adapta à realidade (à impossibilidade de um argumento único aceitam-se melhor vários), o livro sagrado procura, pela força da sua comunidade, deter o mundo. Alguns dirão que a interpretação é sempre necessária; que uma diferença de olhar muda o significado da leitura; que na existência de contradições entre o escrito e o vivido se deve procurar o abuso sem restrições (no Livro se for preciso). Mas a ortodoxia, que recebe o poder deste cessar de mundo, não costuma ouvir mais do que aquilo que lhe interessa.

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