maio 31, 2004

Machina ex homo

Quanto do que fazemos é hábito ou reacção? Relembrar diariamente que não somos só piloto automático.

maio 28, 2004

Perda

Uma fotografia é o constatar da inevitável perda de um momento.

maio 26, 2004

Majorantes

"A sanidade mental não é uma questão estatística" - George Orwell, 1984

maio 25, 2004

Fronteiras II

Da pele nasceu em nós a ideia de fronteira. Desta imitação que não evitamos, transferimo-la para as linhas imaginadas entre rios e montanhas. Só que a pele cresce, é fonte de prazer, está viva. As fronteiras são apenas dela um reflexo de morte.

maio 24, 2004

Koan

Numa estrada infinita
o Zen espera o Fim,
o Tao caminha para o Meio,
a Fé cega ambos.

maio 20, 2004

Micro-narrativas

A blogoesfera é composta por autores, uma intricada rede de blogs e leitores. Apesar da necessidade do emissor por receptores não ser tão forte como nos media, qualquer autor gosta de leitores interessados. Isto ocorre principalmente nos blogs "profissionais" mas não deixa de reflectir-se nos alternativos menos atraídos pelas estatísticas da Technorati. Esta dinâmica favorece descrições sucintas, sem rodeios, com o menor número possível de palavras. Textos longos são lidos em diagonal, o olhar fixa-se nas poucas linhas que encerram "mensagens de sucesso".

Na literatura existem diversas micro-narrativas que exploram os limites da linguagem escrita. Pouco se explica confiando na interpretação alheia. A história contida nesse micro-relato é tão versátil quanto a imaginação voluntariosa do leitor. Tarefa arriscada quando destinado a um público amplo mas atraente pelo espartilho de simplicidade que promove. Entre os exemplos tradicionais encontramos os aforismos, os poemas Haiku, os Koan. Actualmente, destaco as Greguerías de Ramón Gomez de la Serna, os Contos de Gin Tonic do Mário Henrique Leiria e na blogoesfera, as Mil e uma pequenas histórias de Luís Ene. Até se encontram conselhos para esta nova-velha arte.

maio 18, 2004

Encontro

Vermeer - Mulher lendo uma carta

Coberta de expectativa ou surpresa, uma carta é expressão de um momento, de um desejo, de um relato. Mensagem que redime o mensageiro, ideia que se lê, intenção que se escreve, memória retida no silêncio desse triplo encontro.

maio 17, 2004

Fluxo

A cada dia acumulamos diferenças que nos alteram. Cada um de nós é um somatório de passados sobrepostos numa série de contigências até este preciso segundo. Talvez explique porque muitas relações não funcionam ao fim de uns anos: quem se juntou já não existe. Somos outros a manter compromissos de outrora.

maio 13, 2004

Ao racista interessado:

O sexo não surgiu para a reprodução. Muitos seres vivos multiplicam-se sozinhos desde há milhares de milhões de anos. O sexo existe para a mistura.

maio 11, 2004

Fronteiras I

Tudo na fronteira é aversão às tensões que a delimitam.

maio 10, 2004

O Ovo da Serpente

Ingmar Bergman realizou, em 1977, "The Serpent's Egg" sobre Abel Rosenberg, um americano que vai viver na Alemanha dos anos 20. Rosenberg apercebe-se da estranha direcção que a nação Alemã parece seguir. Um dos personagens descreve essa estranheza como o ovo da serpente. Inofensivo porém transparente o ovo mostra, a quem o observar, o animal que germina dentro de si. Uma promessa por cumprir. À espera.


Há 71 anos, no dia 10 de Maio de 1933, em Berlim e noutras cidades várias universidades juntaram pilhas de livros caídos em desgraça pela serpente nazi que enredava lentamente todos os poderes da frágil República Alemã. Esses livros serviram para alimentar enormes fogueiras e discursos que arderam nessa noite. Hitler e o NSDAP tinham acedido ao poder há pouco mais de dois meses. Há três semanas que o novo chanceler alemão dispunha de poder ditatorial. A serpente saíra do ovo e crescia. O pouco que antes havia para resolver transformar-se-ia num Inferno lavrado por dezenas de milhões de mortos.

maio 06, 2004

Aos Georges Bushes (X)

Que seria da virtude sem o vício? Num mundo sem sexo como exerceria o casto a sua hipocrisia?

maio 04, 2004

Diferenças

Os dias correm e limitamo-nos a correr atrás deles. Passamos o tempo a reagir perante o mundo, somos solucionadores de uma sequência infindável de pequenos e grandes problemas. Aprendemos e planeamos para melhorar as respostas, reagimos em conformidade, gerimos as crises dos erros cometidos. Deste limitado ponto de vista, o que nos destingue? Qualquer animal relativamente evoluído é capaz de reagir, aprender, planear. Não é difícil observar uma progressão de capacidades desde os répteis até aos mamíferos, dos Primatas aos Humanos. Deste limitado ponto de vista, existe uma diferença quantitativa do Homo Sapiens em relação às restantes espécies: aprendemos mais, planeamos melhor, aperfeiçoámos a linguagem com a invenção da escrita, construímos sociedades e culturas mais complexas.

Existe igualmente uma diferença qualitativa: a consciência do eu, a análise dos próprios comportamentos, a capacidade de auto-crítica. Esta diferença não serve para responder a perguntas mas para questionar essas mesmas perguntas. Sem ela, é conveniente aceitar a moralidade imposta pela sociedade. É preferível não reler o que já vem acompanhado por algo parecido a uma resposta. É fácil acreditar no branco/preto, no que nos dizem que é certo ou errado, no bom e no mau, o que deve ser ou não censurado.

É verdade que para vivermos em democracia existe a aceitação implícita de um contrato social: cada um de nós transfere um pouco dos seus possíveis para vivermos segundo um padrão de direitos partilhados. Mas nesta transferência não se tem de passar o "eu" para a sociedade. A Ética individual não se esvai na moral actual (que tanto muda). A crítica não tem de parar na convenção do que é errado. O olhar não deve reflectir-se no verniz dos preconceitos. Esse esforço, o esforço que realmente nos destingue dos animais é nosso, nunca dos outros. É um preço demasiado alto a pagar quando decidimos encher de ócio, tédio ou ódio o que nos sobra destes dias que tanto correm.

maio 03, 2004

Viagens

Luis Bacharel - Nocturna, a máquina fantástica

Cada viagem desejada é uma promessa de passado a guardar no futuro. Há aquelas a cumprir na chegada ao destino e há outras a criar no caminho percorrido. Ainda há as que não interessa para onde ou por onde se vai mas como se fazem. É quando o Horizonte se torna mais belo.